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2 de mai. de 2011

Sonhos lavados

Margem do Cais do Porto (Crédito: Dhouglas Castro)


Era uma tarde chuvosa. O clima do cais do porto lembrava, para algumas famílias, momentos passados ali. A chuva, que ajuda o verde e alegra os pássaros, não é o que preocupa os moradores. A paisagem local mais linda sim: o Rio Uruguai. Esta beleza natural que serve de sustento para muitos também é motivo de medo, principalmente quando as chuvas do estado vizinho, Santa Catarina, enchem o rio e as barragens são abertas. Nessas vezes, o Uruguai mostra sua força. Segue seu percurso e toma de volta o que é seu por direito: suas margens, suas terras, seus arredores.

Há quem julga ser incrível a maneira que os ribeirinhos encontram para fugir da enchente. Alguns comemoram as cheias - acreditam que é o período de limpar suas casas. A mesma água que invade suas moradas também purifica, levando de volta para o leito do rio as energias ruins. Outros dizem que é dolorido construir sonhos que depois são levados pela água. O drama das enchentes não é de hoje. Pela legislação brasileira, todas as zonas ribeirinhas são propriedades da Marinha do Brasil. Mas, famílias se apropriam das terras. Constroem seus lares e vidas ali e, mesmo que a Defesa Civil construa e doe casas para que eles larguem essa vida de vez, a maioria não aceita. Preferem a enchente. Acostumaram-se a viver assim.


A prova disso está no olhar, no sorriso e na forma de agir do senhor Assunção Escobar do Amaral, casado, pai de dois filhos, dono de um estabelecimento comercial e residente do Cais do Porto às margens do Rio Uruguai, que hoje é o protagonista desta história.


Um homem que na profundeza de seu olhar retrata dilemas vivenciados durante as enchentes que já enfrentou. E, apesar delas, decidiu permanecer ali. Ele gosta do que faz. Ele gosta do lugar que escolheu para ser seu. Ele gosta dali. Devido às inundações ocorridas durante o ano, Amaral, como é conhecido nas redondezas, construiu um degrau a mais. Superou os obstáculos. Construiu um segundo piso no estabelecimento comercial, juntamente com a casa própria. Assim, quando há enchentes, abriga na parte de cima sua esposa Ângela Maria e seus filhos Fernanda e Felipe.


Mesmo com todo esforço para fugir das cheias, ele conta que em 2005 a enchente atingiu o segundo piso do estabelecimento. Teve que tirar tudo de dentro e, para isso, contou com a ajuda de outros comerciantes do local. É assim que funciona, todo mundo ajuda todo mundo. A solidariedade fala mais alto. As mãos amigas se encontram e, num grande mutirão, todos se salvam de outra investida Uruguai.


Quando o Uruguai vem invadido seu espaço, Amaral mais uma vez o engana. Se o rio pensa que lhe tornará um heremita, ilhado em sua própria fortaleza, ele se engana. Com um barco, as mesmas águas que invadem servem de estradas para que a família mantenha uma vida normal. Para que os sonhos não se percam. Se precisar, mais um degrau será construído. Assim os sonhos são apenas lavados e a vida continua, coerente com o rumo do Rio Uruguai: sempre em frente.


Texto por Dhouglas Castro, Dyuli Soares, Franciéle Rodrigues e Luísa Aranha

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